quinta-feira, 19 de novembro de 2009

TRISTEZINHA DA SEMANA 19

DEPREDISPOSIÇÃO

Juvenal fechara um negócio excelente na firma. Fazer o patrão e o cliente feliz só lhe rendeu elogios. Sua namorada àquele dia, dissera ter uma surpresinha o aguardando. A ex-mulher não havia lhe pedido nada. Tudo maravilhosamente bem. O contrário dele!
Encontrava-se muitíssimo “down” nos últimos meses. Mau o reconhecia. Comia quase nada. Dormir menos ainda. Quando dormia, acordava no meio da noite, já com a cabeça cheia, como se não tivesse descansado um minuto sequer.
Pensava: “Que coisa mais triste! Tenho uma família linda e não consigo mais aproveitá-la. Quando me deito já não desfruto do aconchego da minha cama, pensando que terei de acordar para ir trabalhar, ver as mesmas pessoas, tomar o mesmo café da manhã. Será que é isso? Rotina? Então ótimo! Troco o sabor da geléia no café, aproveito que minha imagem está em alta, peço para o chefe mudar a sala de andar e, me tenho de volta!”.
E foi justamente o que fez. Mas isso lhe deu uma saudade insuportável das coisas cotidianas! Da torradinha com framboesa. Da sala ventilada, cujas paredes serviam de escudo para suas olheiras e vez ou outra de trincheira para traições conjugais. Enfim, Juvenal começou a ter tanta saudade que era pego, com certa freqüência, chorando pela falta do seriado do Tarzan, do Rin-Tin-Tin. Do Garibaldo então, nem se fala.
Aí, começou a se preocupar. E a sentir saudades de quando não se preocupava.
Foi encher a cara com os amigos. Precisava de algumas doses para criar coragem de se abrir. Depois de meia dúzia já nem se lembrava do problema. Ficou tudo por isso mesmo.
A manhã, impiedosa, o trouxe de volta ao mundo da prostração manjada, que torna o campo de visão fundo, vago e sem graça.
Juvenal era um jovem esclarecido e conhecia, de leitura, os sintomas de uma depressão. Sabia dessa onda global de Síndrome do Pânico e achava ridículo que qualquer topada no dedão desencadeasse uma. Como seu dedão e tudo mais ia de vento em popa, começou a cogitar a idéia de procurar um especialista. Afinal, depressão ou síndrome, também se pega na ausência de qualquer motivo aparente. Mas não com ele. Se fosse a um psicólogo seria só por via das dúvidas. Pensou de novo: “Será”?
Já no carro, absorto em culpas que nem tinha, repetia para si mesmo: “Bela merda é você, heim, Juvenal!” Assustava-lhe o fato de, a essa altura, não sentir absolutamente nada dentro do peito. Nem tristeza nem alegria. Nada. Um marasmo de ar. Desesperador, mas que não acelerava o coração e nem secava a boca. Não queria morrer, mas viver também era um saco.
Depois de alguns minutos de consulta ouviu atenciosamente o diagnóstico do doutor:
- É seu Juvenal...tudo indica que o seu caso é mesmo de depressão.
Ainda com os olhos arregalados de espanto, ele deixa o prédio do centro e entra de novo em seu carro. O sangue voltara a circular. Sente sua respiração oxigenando cada fresta do seu corpo. Está mais corado. Lembra de uma piada. Ri sozinho. Repete: “Bela merda é você, heim, Juvenal!” e dá gargalhadas. Está tão eufórico que larga o carro na rua e vai embora a pé. Leve como se desfilasse nas nuvens. Parecia a Gisele Bündchen.

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